A espiritualidade frequentemente sai pela janela no instante em que entramos em uma discussão, tropeçamos em uma crise ou caímos em depressão.



A escuridão toma conta tão rapidamente que esquecemos de tudo que aprendemos.



É por este motivo que é bom estudar diariamente, ler uma passagem da torah ou algum texto inspirador, decorar uma citação ou assistir uns minutos de uma palestra para nos lembrarmos do que é realmente importante.



Dê a sua mente algo para mastigar, para que ela não mastigue a si mesma.



Yehuda Berg


segunda-feira, 2 de janeiro de 2012

Intelecto e Imaginação



Abordemos agora a mente exterior.
Assim como o “da’as”(daath)(“conhecimento interior”) tem um nível de origem que é superior, isto é, o “ratzon” (“vontade” ou “desejo”), também a mente exterior compõe-se de dois níveis.
Estes podem ser compreendidos como “sechel” (“intelecto”) e “dimyon” (“ima­ginação”). Todos os aspectos dos níveis primários ou originais e os seus relacionamentos com os níveis secundários ou exteriores, aplicam-se também aqui.
Tal como nas etapas da experiência há uma fonte superior de inspiração e uma etapa ainda mais difícil que a segue; tal como no da’as há uma fonte inspirada e elevada denominada ratzon, assim também o sechel é uma camada superi­or e a dimyon uma inferior na mente exterior.
Para que possamos entender algo de muito profundo e fundamental acerca da harmonia da mente, tentemos estabelecer a interação que existe en­tre elas.
Contida nesta discussão, existe uma chave essencial ao controle da mente e ao poder de concentração.
 
Todos os pares de macho/fêmea ou de projeto abstrato/cons­trução concreta compõem-se dos mesmos elementos básicos.
Definamo-los e apliquemo-los ao relacionamento sechel/dimyon “intelecto/imaginação”,. O projeto ou nível de código é abstrato mas contém todas as ins­truções necessárias para que o nível físico execute tudo o que deve ser executado (tal como ocorre com os genes com os quais o pai contribui, que contêm tudo o que é necessário para que a mãe, de fato, forme a criança).
O nível abstrato não necessita de energia.
Toda a força e poder para a construção física cabe à mãe, é a sua contribuição no nível mais físico.
O nível abstrato é todo de pura teoria, o nível físico é todo de palpável realidade.
Um sem o outro é inútil: um projeto sem execução permanece como teoria.
Um construtor que não tenha um projeto edificará nada mais do que uma acidental e ilógica confusão.
Porém, quando juntos, um significante, bem planejado e bem executado resultado será alcançado.
 
O Maharal expressa este relacionamento como aquele existente entre a “forma” e a “substância”.
A forma é um conceito abstrato, a substância é palpável, tangível.
A forma se impõe sobre a substância; é assim que a substância adquire uma forma. Todas as substâncias devem ter alguma forma; todas as forma devem ter alguma substância para poder expressá-la.
A harmonia é alcançada quando a substância expressa a sua forma na maneira mais apropriada, mais bela.
Eis a profundidade do entendimento de todas as artes e da estética.
 
Como é que tudo isto se expressa no sechel e no dimyon, no intelecto e na imaginação?
 
O intelecto é de pura teoria.
É o conjunto de instruções; são os caminhos lógicos que a mente utiliza para pensar.
É uma pura forma, uma pura lógica abstrata.
E a imaginação, por sua vez, conjunto de imagens gráficas que a mente contém e constrói, proporcionando a substância que o pensamento manipula.
Ou se preferir, o intelecto é o programa do computador, a imaginação é informação específica que deve ser dada ao computador para que o programa funcione.
O Intelecto é a parte lógica de uma equação matemática; a imaginação é o conjunto de números específicos contidos na equação.
 
O intelecto não possui energia inata; a imaginação sim.
Quan­do nos recostamos numa confortável poltrona e relaxamos, o in­telecto não funciona, a imaginação sim
O intelecto deve ser espe­cificamente motivado, intencionado.
Para desenvolvermos uma série lógica de pensamentos, devemos ter esta intenção e traba­lhar nela. Para experimentarmos a livre imaginação, temos de “silenciar” o lógico.
Mais do que isto: é extremamente difícil manter um pensa­mento lógico; na verdade é extremamente difícil concentrar-se num determinado assunto por qualquer lapso de tempo.
O que normalmente acontece (e, normalmente, isto acontece quando menos queremos!) é que, no meio de um pensamento lógico, al­guma imaginação estranha cresce em nossa mente e, num instan­te, uma série de associações aparece, levando-nos ao devaneio, sonhando sobre algo totalmente distante daquilo com o que co­meçamos, levando-nos a, sequer, lembrar como ali chegamos!
Basta que tentemos uma intensa concentração ao rezarmos a “shmone esrei” (a prece das dezoito bênçãos, a principal do ser­viço litúrgico) para entendermos como é difícil mantermos um pensamento rigorosamente lógico, produtivo e ordenado.
A razão para este problema é que o intelecto é passivo, ele deve ser conduzido, mas a imaginação é cheia de energia - ela tem autonomia, funcionando por si só.
Por definição, a imagina­ção é composta de imagens gráficas, memórias, ilustrações e não tem nenhuma lógica própria, as suas associações são aleatórias, casuais e ilógicas. Por estar todo o poder investido na imagina­ção, ela está ligada às emoções e aos impulsos básicos da perso­nalidade; ela possui toda a energia necessária para construir, para tornar tangível - ela foge descontroladamente sempre que lhe seja permitido.
O caminho é, dolorosamente, familiar: você vai do passo “A” para o passo “B” numa seqüência de pensamentos lógicos, ten­tando solucionar um determinado problema ou, digamos, para planejar algum evento importante.
Assim que você consegue che­gar ao passo “B” um detalhe periférico e irrelevante desta etapa estimula uma poderosa lembrança (um elemento gráfico, cheio de energia, da imaginação). Aquela lembrança, por pura associa­ção, deflagra uma outra.
Algum detalhe periférico daquela outra lembrança desencadeia, por sua vez, uma outra imagem, uma outra ilustração, uma outra lembrança. E, mais uma vez, você se encontra num devaneio tão intenso que esquece o presente e esquece o problema que você se propôs a solucionar. Irritado e frustrado você desperta do devaneio, do sonho e recomeça a trilhar pensamento lógico. Até o próximo repente de distração.
 
Isto tudo é bastante familiar a cada um de nós.
É raro que haja uma pessoa que tenha desenvolvido a autodisciplina de pensar ou raciocinar sobre um determinado assunto, até mesmo por alguns minutos, sem distrair-se.
O segredo é levar a imaginação para o controle do intelecto.
O dimyon deve servir o sechel.
O sechel deve informar e dirigir o dimyon.
O intelecto deve invocar apenas aqueles elementos da imaginação - imagens, lembranças, fatos - que são necessário para aquela etapa do processo de pensamento ou raciocínio e nada mais.
Quando aquela determinada etapa é concluída, aqueles elementos gráficos devem ser suprimidos e o conjunto de elemento seguinte deve ser invocado.
A imaginação não deve, jamais, abarrotar o intelecto, jamais se intrometer com toda a sua riqueza de lembranças, imagens e emoções.
Tal harmonia é o controle do pensamento.
Isto é concentração.
Esta harmonia assume diversas formas variadas.
Por exem­plo: um grande artista criativo dará asas à sua imaginação. Estan­do a imaginação quase em total liberdade, o intelecto proverá apenas o controle suficiente para que haja concórdia entre o as­sunto, o tema e a criatividade, um equilíbrio, uma conexão estéti­ca.
O equilíbrio será tal qual o de um poderosíssimo cavalo con­duzido e direcionado por um pequenino, porém altamente sensí­vel e bem treinado, cavaleiro. Por outro lado, um capacitado ma­temático forçará a lógica a predominar, quase que totalmente: a lógica precisará de fatos, valores, números, para produzir sufici­entes formas palpáveis a serem processadas.
Eis a análise do pensamento.
Sua compreensão pode ser um fator profundamente significativo no desenvolvimento da con­centração. O objetivo é um perfeito casamento, uma perfeita har­monia entre a forma abstrata e a substância palpável, entre a raiz abstrata da lógica na mente e a expressão gráfica da imaginação.
Esta harmonia entre opostos é a verdadeira beleza.
 
Por: Nilton Bonder

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