A espiritualidade frequentemente sai pela janela no instante em que entramos em uma discussão, tropeçamos em uma crise ou caímos em depressão.



A escuridão toma conta tão rapidamente que esquecemos de tudo que aprendemos.



É por este motivo que é bom estudar diariamente, ler uma passagem da torah ou algum texto inspirador, decorar uma citação ou assistir uns minutos de uma palestra para nos lembrarmos do que é realmente importante.



Dê a sua mente algo para mastigar, para que ela não mastigue a si mesma.



Yehuda Berg


quarta-feira, 21 de março de 2012

Há Duas Realidades Básicas: Nosso Mundo de 1% de Escuridão e o Âmbito de 99% da Luz



Assim como Veruca Salt em A Fantástica Fábrica de Chocolate, parecemos passar pela vida gritando "Quero agora!"
Mas lembra do que aconteceu a Veruca quando ela finalmente pôs as mãos no ovo de ouro?
Ela caiu na calha para ovos ruins, com seu indulgente pai caindo atarantadamente aos trambolhões atrás dela.
É claro que Veruca é um exemplo extremo, mas todos sabemos que, quando o desejo clama, sua voz é alta e clara.
 
Alguns de nós aprenderam a ter paciência e outros aprenderam o valor da qualidade em relação à quantidade — mas ainda assim nossos quereres nunca parecem se satisfazer.
Isso é mais aparente quando se trata de nossa zona de conforto básica.
Quando estamos com frio, botamos um casaco e logo depois ficamos aquecidos demais. Então tiramos o casaco e tomamos uma bebida gelada.
Depois, é claro, ficamos com frio de novo, só que agora precisamos ir ao banheiro. E assim vai.
Ficamos saciados, mas apenas momentaneamente.
Da mesma forma, queremos o aparelho de som "certo".
E depois de muito insistir, ganhamos.
Então ficamos satisfeitos por alguns dias, mas pouco tempo depois percebemos que queremos uma outra coisa: ou os fones "certos" ou o microfone "certo".
Ou talvez tenhamos que ouvir a banda "certa".
Da mesma forma, somos inquietos com os amigos e a família.
Decidimos que conhecer esta ou aquela pessoa nos tornará "descolados".
Mas depois de conhecê-la, não estamos mais assim tão descolados; por dentro ainda somos os mesmos e não nos sentimos mais satisfeitos conosco do que antes. O buraco escuro do desejo não está nem um milésimo mais raso.
 
Na verdade, nosso novo amigo pode nos fazer ter mais consciência das coisas que não temos.
Esse tipo de desejo é doloroso porque não acaba.
É insaciável.
É o desejo pela gratificação externa.
Ele pertence ao que é chamado de Realidade do 1%.
Uma realidade é um mundo que se basta.
Se um dos leitores for escritor, é o que você cria ao escrever uma estória.
Seus personagens, suas casas, seus empregos, suas famílias e seus amigos, e seus bichos de estimação, todos vivem na realidade da sua estória.
O mesmo se dá com uma pintura ou uma fotografia — o que quer que você decida pintar ou retratar pertence a essa realidade.
Os diretores de cinema criam realidades todo dia.
A Realidade do 1% é aquilo que a maioria de nós conhece, apesar de provavelmente não termos consciência disso.
Passamos a maior parte da vida nela, assim como a maioria de nossos amigos e familiares.
É a realidade física, o mundo das emoções e dos cinco sentidos.
Aqui as pessoas e os objetos podem ser tocados.
Possuem cheiros e gostos específicos.
O corpo é nossa linha da vida nessa realidade e precisa ser cuidado de forma adequada.
Tempo e espaço mandam aqui.
Nascemos, crescemos, envelhecemos e então morremos.
O carro novinho em determinado momento quebra e não pode mais ser consertado, então enferruja até que a carroceria metálica fica toda esburacada.
Tudo na Realidade do 1% chega ao fim.
Aqui, nada é infinito.
Não há possibilidade de felicidade infinita ou alegria infinita, quanto mais de vida infinita.
Este também é o âmbito da reação, e do caos que isso gera, porque reagimos quase sempre sem pensar.
Se há uma coisa que eu gostaria que você tirasse destes textos é a necessidade de
parar um momento para pensar, pensar, pensar antes de reagir a uma situação.
O objetivo destes textos é ensiná-lo a tomar decisões conscientes e embasadas — decisões tomadas com base na certeza, e não na mera crença, e decisões que revelam a Luz.
Discutiremos o comportamento reativo com mais profundidade no próximo texto, mas, até lá, experimente parar, nem que seja para respirar profundamente antes de reagir a qualquer circunstância que o aborreça.
 
Sem dúvida, há muitos prazeres nessa nossa realidade — ir ao cinema, dançar, tirar férias com a família, descobrir o sexo, virar d noite acordado com os amigos, ganhar um carro novo, conseguir o primeiro emprego.
Mas, como já falamos, esses sentimentos vêm e vão.
É da natureza do prazer.
Tente pensar num exemplo de prazer que tenha durado na sua forma original pura. Você pode pensar "Bem, senti um amor puro pelo meu gatinho!"
Mas seu gatinho não cresceu e perdeu um pouco do que o tornava tão fofo e de que tanto você gostava?
E não é parte das suas tarefas ter que limpar o cocô dele uma ou até duas vezes por dia?
E ele não fica exigindo atenção sem parar, quando às vezes quem quer atenção é você?
Certamente ele ainda lhe traz muita alegria, mas isso não é ininterrupto.
Não é Infinito.
Eis uma outra palavra-chave.
Daí também é de onde todos nós surgimos.
É o que chamamos de Realidade do 99%.
É onde está a Luz.
Se a Realidade do 1% é o reino do prazer, a Realidade do 99% é o reino da realização.
Chegamos lá não por satisfazer nossas necessidades externas, mas por voltar nossa atenção para dentro de nós mesmos. Na Realidade do 1%, entramos num estado de excitação tentando coçar comichões que nunca ficam no mesmo lugar — comichões que são insaciáveis porque são apenas sintomas.
Na Realidade do 99%, podemos começar a atacar a causa.
Pense quando você tem um resfriado. Um dia sua garganta dói, no dia seguinte seus olhos lacrimejam, no outro a temperatura sobe e, por fim, seu nariz fica congestionado. A cada dia aparece um sintoma novo e você tem que tomar um remédio novo para atacar esse sintoma. Isso não é ruim. Na verdade, nesse ponto, é necessário; os sintomas precisam ser atacados. Mas a causa desses sintomas é um sistema imunológico comprometido.
Então, se tratarmos apenas dos sintomas, eles podem amainar, mas há boas chances de que eles ressurjam bem rápido — provavelmente mais fortes.
Em vez de se manifestarem como uma gripe, podem agora se manifestar como uma infecção de garganta, uma pneumonia ou até mesmo um câncer.
Então, se cuidarmos apenas de aliviar os sintomas, nada estará mudando de verdade. Se, contudo, tratarmos a causa além de tratar os sintomas, a próxima gripe provavelmente será menos grave, assim como a seguinte.
As gripes se espaçarão. E por fim pararemos de ficar doentes.
Quando eu estava no 2° Grau, meus pais compraram casacos combinando para mim e meu irmão. Como já mencionei, não tínhamos muito dinheiro, mas precisávamos de roupas quentes para sair, para nos proteger dos invernos rigorosos de Nova York. Meus pais gostaram desses casacos novos. Gostaram principalmente do fato de que eles combinavam. Eles achavam que ficávamos lindos neles. Mas eu e meu irmão odiamos os casacos. Os garotos da escola estavam usando impermeáveis com capuz e jaquetas dos Mets. Ninguém — ninguém mesmo — estava usando na escola aquele tipo de sobretudo de lã três quartos, próprios para se usar em enterros. Nossa fama na escola ficou ainda pior. Nunca vou me esquecer do momento em que vi aquele casaco.
Eu estava esperando por ele há uma eternidade e depositava muitas esperanças no que ele faria pela minha reputação. Mas, quando o vi pendurado, quase chorei. Claro que era o meu 1% falando — a parte de mim que achava que algo externo poderia dar um jeito na minha vida. Por fim, acabei me afeiçoando muito àquele casaco. Meus pais tinham trabalhado duro para ter condições de comprá-lo e o tinham escolhido com amor e carinho. Quando me viram nele, se sentiram realizados. Quando acabei entendendo isso, desenvolvi uma profunda afeição pelo meu casaco feio. Parei de me preocupar com o que os outros garotos diriam.
Parte de mim tinha alcançado a Realidade do 99%.
O período que antecedeu a essa afeição, no entanto, foi bem difícil para mim. Senti-me culpado e indigno.
Mas meu pai já estava me dando aulas de Cabala e eu estava começando a internalizar alguns ensinamentos.
Durante minha luta com o casaco, me concentrei no passo que você está lendo agora — a percepção de que duas realidades existiam simultaneamente.
Percebi que ao botar tanta energia em estar desconfortável com o meu casaco, estava desperdiçando energia que poderia estar sendo canalizada para a Realidade do 99%. Nesse momento, tomei uma decisão consciente de redirecionar essa energia para algum lugar mais produtivo.
Para mim, isso foi o início do mergulho na Realidade do 99% - o início da minha abertura para a Luz.
A Luz denota felicidade infindável e alegria constante — não apenas felicidade e alegria normais, mas felicidade infindável e alegria constante.
Pare um instante e pense em como você se sentiria. É a diferença entre prazer (que, como já dissemos, vem e vai) e realização.
Desejamos o ilimitado. Não queremos nos dar bem na escola só metade do semestre. Preferimos não namorar alguém de quem só gostamos um pouco.
Não queremos ser amigos de alguém por somente um mês e depois ter que começar tudo de novo com outra pessoa. Ou estar no time de basquete só metade da temporada.
Queremos que nossos desejos sejam constantemente entendidos e continuamente realizados. Isso é o que acontece na Realidade do 99%.
Antes que você fique chateado por não ter a Realidade do 99% agora, permita-me dizer que, na verdade, você tem.
Todos nós temos acesso a ela, mas, para a maioria, isso é algo efêmero.
Pense no momento em que dá os toques finais num projeto no qual acredita piamente — um projeto que leva tempo e despende muito esforço para ser concluído. Essa sensação de trabalho bem feito é a Luz. E quanto ao momento em que decidiu dividir o quarto que mal cabia um com sua amiga, porque o pai estava batendo nela, e você, com seu gesto, tornou-lhe a vida mais fácil? Isso também é a Luz. Maravilhar-se com uma fileira de tulipas perfeitas. Cantar "Parabéns para você" para seu irmão mais novo. Recusar drogas oferecidas por amigos particularmente persuasivos. Receber elogios merecidos de um professor.
Todos esses são aspectos da Luz.
A dica agora é entender como obter isso quando quiser — e como fazer isso durar. Você já teve a intuição de que se fosse a uma determinada festa, apesar de estar cansado e de mau humor, algo de bom iria acontecer — e quando foi, conheceu seu futuro melhor amigo, se apaixonou ou simplesmente se divertiu muito?
Ou quando sabia, sem explicações racionais, que, se andasse por uma determinada rua, algo de ruim iria lhe acontecer, e mais tarde descobriu que houve um tiroteio nessa rua, no qual um garoto foi assassinado? Isso é a sua intuição guiando-o.
E sua intuição é dada pela Luz.
Segundo a Cabala, há uma cortina separando a Realidade do 1% da Realidade do 99%. Essa cortina é tudo que nos mantém longe da realização total.
A intuição é um meio de afastar a cortina, mas há outros.
Estes textos o familiarizará com a cortina. E a cada passo que der, abrirá a cortina um pouco mais.
 
Uma coisa importante para se lembrar é que o desejo é o que nos une.
Desejo pela paz mundial ou desejo pela guerra. Desejo por pizza ou desejo por salada. Por mais profundos ou triviais, os desejos humanos são nosso elo comum. Todos desejam a felicidade; ninguém deseja o sofrimento. Mas, com frequência, confundimos a busca do outro pela felicidade — o fato de ele evitar o sofrimento — como sendo algo "contra mim".
Com que frequência, por exemplo, você pensou que um amigo, um professor ou um parente estava zangado com você por estar lhe dando menos atenção do que o normal, para descobrir logo depois que essa pessoa estava vivendo uma tragédia pessoal — talvez a morte, uma doença ou uma briga em família —, que simplesmente a tornara mais introspectiva por certo tempo? Afastando-se não apenas de você, mas de todo mundo, até se sentir centrada de novo.
Conheci uma mulher, que chamaremos de Anna, que se encontrou por acaso com a irmã de seu primeiro grande amor (o chamaremos de Matt) numa viagem de navio. As duas moças conversaram por um tempo e então Anna deu seu telefone para a irmã de Matt, que se dispôs a passá-lo ao irmão. Anna ficou esfuziante com a possibilidade de falar com Matt. Ela tinha gostado muito dele, tanto durante o namoro quanto depois por vários anos, mas depois perderam o contato.
Ela lembrava dos momentos que tinham passado juntos com carinho e se considerava muito afortunada por ele ter sido sou primeiro amor. Nos primeiros dias depois que voltou para casa da viagem de navio, Anna zanzou pelos cômodos, correndo para atender ao telefone toda vez que tocava. Mas nunca era o Matt. Semanas, e depois meses, se passaram. Anna levou para o lado pessoal o fato de Matt não ter ligado. Não devo ter significado tanto para ele como ele significou para mim, pensou ela. Se ele gostasse de mim de verdade, já teria me ligado. Os pensamentos de Anna foram ficando cada vez mais negros até que ficou bem deprimida com toda a situação. Meses depois, Matt ligou. Ele e Anna conversaram alegremente e, no fim, ele se desculpou por não ter ligado antes. "Tive uma doença de pele horrorosa", segredou ele. "Queria que sarasse antes de te encontrar." Quando levamos os atos de alguém para o lado pessoal, é o nosso ego falando, nos dizendo que somos o centro do universo — que tudo que acontece na vida gira em torno de nós.
Nosso ego é a cortina que nos separa da Realidade dos 99%.
Quanto mais a dominamos, mais a cortina se abrirá.
Com que frequência você já escutou ou usou a expressão de repente?
De repente, meu irmão mais velho foi parar na prisão; de repente, ela terminou o namoro comigo; de repente, o técnico o expulsou do time; de repente, minha mãe foi embora de casa. Mas o quão repentinamente é de repente?
Por exemplo, quando foi que você acordou e de repente encontrou uma árvore no quintal? Ou descobriu que seu cabelo tinha de repente crescido cinco centímetros? Ou que de repente você vivia numa casa nova? Isso não é provável.
"De repente" implica numa sensação de caos, numa sensação de que as coisas nos acontecem, em vez de entender a verdade mais profunda de que nós acontecemos a nós mesmos.
Acontecer a nós mesmos é uma coisa boa.
Na verdade, é uma coisa ótima! É a melhor coisa que pode nos acontecer.
Ninguém mais está no controle. E, apesar disso gerar muita responsabilidade por nossos pensamentos, palavras e atos, também nos abre possibilidades ilimitadas. Já moldamos nosso passado, talvez sem o saber. E temos o poder de moldar também nosso presente e nosso futuro. Enquanto estiver lendo estes textos, guarde este pensamento na mente: se algo me acontecer, estou preso na Realidade do 1%. Estou reagindo.
Mas se eu fizer algo acontecer — seja isso bom ou ruim — estou me conectando com a Realidade do 99%. Estou sendo proativo.
Não espere entender isso totalmente agora.
Essa ideia é uma enorme mina de ouro que continuaremos a explorar nos textos  seguintes.
 
Muitos de vocês devem estar familiarizados com a teoria do caos, ou o que chamamos às vezes de "efeito borboleta". Uma borboleta que bata suas asinhas em Tóquio pode deslanchar uma mudança na pressão atmosférica que venha a gerar um furacão em lowa.
Uma mulher que bata a janela do seu quarto numa noite escura de inverno em Londres pode fazer gerar uma formação de nuvens sobre as ensolaradas praias brasileiras.
Tudo está conectado.
O tempo só parece aleatório para os meteorologistas porque eles não conseguem perceber e mensurar todas as milhões de influências que contribuem para isso — como asas e janelas batendo. No entanto, na verdade, há uma ordem que nos é oculta.
O mesmo pode ser dito em relação à nossa vida.
Não importa o quão caóticas nossas vidas pareçam, tudo o que acontece tem uma causa específica. Mas, assim como fazemos quando pegamos uma gripe, sentimos primeiro os efeitos. Em grande parte, somos incapazes de enxergar as causas verdadeiras porque estamos parados atrás da cortina. Mas, lembre-se, a cortina é nosso ego. Ele nos pertence. E, portanto, podemos modificá-lo.
Houve um tempo, antes de você nascer, em que as pessoas não faziam a ligação entre jogar fora resíduos tóxicos no mar e milhares de pessoas ficarem seriamente doentes por comerem peixe de água salgada. Parecia-lhes que uma praga os tinha atingido. Era assustador. As pessoas sentiam que algo terrível poderia lhes acontecer de repente — algo sobre o qual não tinham qualquer controle.
Por fim, através da pesquisa e da investigação cuidadosas, as conexões entre o lixo tóxico, o peixe e as doenças se estabeleceram.
Esforços de limpeza começaram e as pessoas pararam de ficar doentes.
Caos é a percepção errônea de que não há conexões.
De fato, tudo está conectado.
Tudo.
Interdependência significa que sua presença neste planeta tem importância.
Assim como o suave bater de asas da borboleta, seus atos ressoam para além de seus sonhos mais loucos. Portanto, aja de forma responsável.
Lembre-se também que os atos do seu vizinho também estão ressoando.
Então, não subestime o seu vizinho. Ao encerrar este texto, deixe-me dizer que não há nada de errado em cobiçar um jeans novo ou querer beijar a garota bonita da sua sala ou desejar passar no teste para tirar carteira de motorista.
Ter seus desejos satisfeitos nesta realidade é parte do processo natural de viver e aprender. A Cabala não lhe pede para desistir de todos os prazeres mundanos. Você não precisa raspar a cabeça, nem viver num monastério.
A Realidade do 1% existe. Os prazeres desta realidade devem ser desfrutados.
Mas nunca se esqueça de que eles não duram.
Não podemos contar com eles para transformar a mente de forma a penetrar na realidade em que eles duram. Encare-os como áreas de repouso ao longo do caminho — lugares em que se pára para comer, descansar e relaxar.
É no desejo subjacente que devemos prestar atenção: nosso desejo pela Luz.  
 
Por: Yehuda Berg

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